10.8.10

17.7.10

PANDORA (α)

Eu estava tão acostumado a fazer aquele caminho que o ato de pensar só apareceu quando o tiro atingiu o meu peito. Ouvi o bang no mesmo momento que cai no chão, e pela dor meus olhos fecharam e meus ouvidos ensurdeceram, o que me impediu de ver os rostos apavorados e a correria que surgiu. De algum modo aquilo foi tão forte que eu perdi a capacidade imediata de pensar racionalmente sobre o que estava acontecendo, e então veio aquela sensação errada, aquela sensação que não era dor. Eu me senti afogando, deitado no meio da rua, completamente seco e me afogando. Eu tentava puxar o ar para meus pulmões mas nada vinha além daquela água seca que não me trazia oxigênio e aquela situação me deu um desespero gigante e horrível porque eu sabia que eu ia morrer. Eu abri os olhos e mexi as mãos para tentar chamar ajuda, para pedir por um pouco do ar de alguém, e todos estavam lá, ao meu redor, alguns chorando, alguns com cara de nojo mas a grande maioria apenas olhava. Então eu olhei para mim mesmo, para o meu peito, e vi aquela ausência vermelha de carne bem no meio do meu corpo e eu me senti tão insuportavelmente vazio que o desespero aumentou ainda mais e piorava a sensação de afundar. Não era justo eu morrer naquela hora, eu tinha tantas coisas para fazer, tantas coisas para falar e agora tudo ia ficar sepultado pela minha incompetência. Eu abri minha boca e comecei a gritar, mas só saía sangue de mim e aquilo era tão cruel e ridículo que eu tinha vergonha de mim, exposto daquele jeito para todos como um covarde que não teve coragem de viver. Do buraco no peito eu senti uma coceira misturada na dor: vários pedaços de papel começaram a sair da ferida, papéis de várias cores, a grande maioria branca e bege, ensanguentados e amassados, e nesses papéis eu conseguia reconhecer palavras, frases, com caligrafias minhas e esses papéis flutuavam em direção ao céu como pombas magras em direção a migalhas. Eu juntei toda força que ainda restava para tentar pegar aquelas folhas porque elas eram minhas, elas eram tudo de bom que eu ainda tinha mas meu braço não se movia, eu não conseguia nem mais sentir meus membros; então eu tentei levantar meu tronco, pegar as folhas com a boca como um animal, mas o ar estava tão pesado que eu não dava nem para mover a cabeça. Eu só podia ficar lá, parado, sentindo meu corpo esvaziar enquanto as folhas fugiam de mim e Deus, como aquilo era deprimente.

15.7.10

Um vez uma personagem minha disse uma coisa com a qual eu me assustei e quase acreditei que ela tinha milagrosamente criado vida e dominado sua própria existência. Era alguma coisa do tipo meus sonhos são apenas sonhos e são bons sendo apenas o que são.


Mas talvez não.

20.6.10

Tô cansado de escrever esses pós-modernismos pop e ridículos. Oblivion realmente me inspirou a escrever naquela vez, mas é idiota mencionar o texto logo no comecinho, principalmente porque é em inglês e o resto é em português. Sem contar que há tantas, inúmeras canções brasileiras que expressam o mesmo sentimento e poderiam muito bem substituir. Odeio também os títulos em inglês porque eles não fazem sentido e são apenas um placebo para minha incapacidade de derivar ideias boas fora do poço de músicas pseudodepressivas e no final não fazem sentindo e no final são apenas mais merda em cima da merda em cima da merda
Odeio olhar para tudo que eu escrevi aqui e olhar tudo que eu deixei escrever e perceber como eu enfeitei e maquiei meus textos com excessos de adjetivos e outras expressões morfológicas que eu não consigo lembrar o nome e como no final todos os meus textos são apenas gigantes travestis andando com seus pênises expostos e seios caídos, e como esses travestis imorais se acham o máximo, acreditam ser a maior expressão de revolta contra um sistema inexistente e toda vez que eu olho para essas putas travestis eu me envergonho porque elas são porcas, são nojentas, são doentes, mas o pior de tudo é toda essa fé de que elas estão bonitas de que elas estão certas e deus sabe como eu tenho a todo momento vontade de deletar toda essa merda e recomeçar, mas deus sabe o quanto essas travestis são minhas criações e representam meu passado então eu não apago porque não é mais possível apagar, e elas vão ficar sempre aqui, me humilhando e rindo de mim porque deixei de acreditar que elas faziam sentido.
...
deus, como eu odeio esses momentos que as ideias e as emoções tão fermentando e aumentando sua massa em mil dentro de você e você não consegue ou não pode escrever e você fica acordado de olhos fechados e sabe que você está errando mas foda-se, você pelo menos por aquela hora quer errar, quer errar muito  e remoer todo esse error dentro de você porque você sabe que assim que der seis horas em ponto você tem que parar com isso então vai chegando cinco e quarenta cinco e cinquenta cinco e cinquenta e cinco cinco e cinquenta e oito cinco e cinquenta e nove e seis acabou chegou a hora de viver mas você não quer viver você só quer remoer porque remoer é bom remoer é a unica coisa que você sabe fazer porque você é inútil você é um deficiente mental você é um retardado você é um animal ridiculo e grotesco grotesco fudidamente grotesco]

e eu estou cansado desculpa
mas é por isso que eu parei de escrever aqui
desculpa também pela ausência de pontos e pelos erros grosseiros, fudidamente grosseiros, não to com cabeça para eles agora to so escrevendo o que vem na minha cabeça e é como eu disse não dá tempo de pontuar vem tudo de uma vez e fica horrível mas desculpa, é a única coisa que posso fazer

27.4.10

[rascunho] Capítulo □□□ - [Corra]

Father, where's my gun?
Now that the war has begun
Oh let me go it alone
I need no one
I said I need no one


Talvez, se houvesse a possibilidade dele sentar e descansar, G. pensaria em como nunca tinha corrido tanto em sua vida. Mas não havia mais possibilidade para isso.

30.3.10

colors die many times before their death.

Ele joga a moeda para o alto e quando o pequeno metal cai na mesa encardida, Ele o tapa com a mão esquerda, abafando o tintilar e mostrando dedos nodosos e unhas mal cuidadas. Nesse meio tempo, Ela apoiou-se com os cotovelos sobre a mesma mesa e fechou os olhos, pensando se não era melhor terem ido ao cinema ou ficado cada um em sua casa, pelo menos dessa maneira poderia ser evitado o que estava por vir.




4.1.10

O buraco. 2



-Não. Não existe essa possibilidade.
-Mas...
-Não.

...

Uma catedral feita inteiramente de vidros e mosaicos com certeza não é um local ruim de morrer. A iluminação hiperrefletida que a construção proporcionava através da luz do Sol tornava aquele ambiente onírico, e como uma mágica milenar presente na atmosfera, pequenos cristais imaginários de luz brilhavam e brilhavam, mini-sóis particulares daquela construção que transcendia a noção terrena. O ar mantinha um aroma de miosótis, lavanda e oliveiras, e pequenas flores vermelhas se espalhavam pelas paredes e chão ao redor do altar. O casal sorria pra ele, dois jovens sorridentes, sorrisos brancos como papel, cabelos bagunçados, tranças infantilmente feitas no cabelo da menor, uma garota de uns 10 anos, cabelos lisos como a maré, negros como um corvo selvagem, e um vestido rendado simples, ridiculamente simples, pano vagabundo e manchado de café, laços de cetim, sapatilhas de couro, mas apesar da modéstia, aquele conjunto caia nela como um vestido de gala para uma valsa com o príncipe das histórias de fadas. O jovem, nove anos mais velho, a personificação não-certa do príncipe encantado, cabelos loiros e sujos, piscava com um sorriso sarcástico, mostrando olhos azuis e dentes alinhados. Uma camisa branca e um jaleco de couro preto caiam sobre seu tronco pequeno, ombros curtos, braços finos. A calça de algodão prendia firmemente as pernas magras, destacando mais do que deveria os joelhos nodosos e o tênis vermelho que ele usava.
Entretanto, nada disso, absolutamente nada, alterava o estado de espírito do homem que os observava em frente ao altar. Seus olhos vagos não refletiam a extrema e exagerada iluminação daquele local, buracos negros de solidão, seu cabelo e suas roupas sociais encardidas não balançavam com a brisa marítima que invadia a catedral, sua boca seca e branca não mostrava o sorriso daquelas crianças, seu corpo, surrado como um saco de lixo, não acompanhava o ritmo daquele local. A única coisa que se mexia eram suas mãos, esqueléticas e apáticas em contraste com as mangas do terno cinza, como um molusco asqueroso saindo de sua concha. Molusco esse que não parava de tremer, mas não de frio noturno, não de um beijo de amor, não de uma morte inesperada. Tremia por não ter outra opção.
Pequenas flores vermelhas se espalhavam pelas paredes e chão ao redor do altar. Flores pequenas, grandes, pontuais, gigantes, disformes. Com o cessar do Sol, os cristais de luz desapareceram, o ar parou de rondar a construção, o aroma doce se dissolveu naquele cheiro amargo, grotesco e pesado que ele conhecia muito bem. Vinha daquelas flores vermelhas do altar. Flores disformes, grudentas, liquidas, solidificadas, escarlates, pedaços de sangue, vísceras e carne podre espalhados por todos os lados ao redor dos dois jovens. O homem se aproximou dos dois corpos, ainda com o revolver em sua trêmula mão. Tocou os dois buracos que fez bem no meio do tórax deles, dois buracos de carne vermelha, sangue resfriado e ossos espatifados. Meteu a mão dentro da caixa torácica da garota, remexeu, girou, tateou como quem procura uma meia da sorte no fundo da gaveta de roupas, e arrancou num gesto bruto o coração espatifado da menina. Olhou o órgão, cheirou, lambeu e por fim o jogou no chão. Fez o mesmo com o garoto, pegou seu coração e nem sequer o pôs perto do nariz. Só o tato o mostrava que aquilo também não era o que procurava.
Nada disso o abalava. Talvez porque aquele sentimento onírico já fosse rotina a ele, talvez porque essa rotina já fosse completamente ignorada por seu coração, talvez porque seu coração estivesse cortado ao meio como um pedaço de carne de terceira rodeado de moscas que é comprado naqueles açougues de periferia por uma mãe de três filhos nojentos, cachorros vira-latas nojentos, que só babam choram e pedem por comida, mas não tem comida. Por que não cala a boca desses vermes meu deus, clama a mãe, mas deus não ouve. Deus nunca ouviu a mãe, deus nunca ouviu a ninguém. Nem a ele. Nunca importaram suas preces, seu desespero, seus gritos, seu sangue derramado, suas mortes, suas camisas manchadas, seus amores perdidos, nunca importaram o calvário na terra, a cruz metálica que carregava. Nada importa. Apenas desista, abandone a esperança, cruz do mundo irreal, pare de rezar, pare de crer, para com a fé, apenas pare de EXISTIR.

...


-Será que um dia seremos felizes, G.?

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